Vivemos num período de imposições e imperativos. Num período em que as revistas dizem o que a gente deve fazer para ter um corpo de celebridade. Em que as igrejas dizem o quanto a gente deve pagar pra conseguir uma vaguinha no céu. Em que os médicos dizem o que a gente deve comer para prolongar a expectativa de vida. Em que os vizinhos dizem como a gente deve se comportar para não parecer um ~vagabundo~ ou uma ~mulher da vida~. Em que o mercado de trabalho diz como devemos nos vestir para sermos pessoas de respeito. E em meio a tantos deveres, é óbvio que o sexo não passaria impune. A cartilha do bom transador versa sobre quantas vezes por semana você deve fazer sexo para ser feliz; dá dicas ~infalíveis~ para você, mulher, gozar, e para você, homem, conseguir dar dez numa noite só; determina algumas táticas certeiras para você, homem, levá-la para a cama ou para você, mulher, deixá-lo apaixonado depois de uma performance de cair o queixo… E por aí vai.
Quem não enxerga o quão prejudicial isso é para as relações amorosas, sexuais e humanas precisa urgentemente colocar os óculos do bom senso. Em primeiro lugar, porque esse tipo de cartilha pouca coisa faz além de propagar estereótipos de gênero – e o mais claro deles é o bom e velho “toda mulher quer romance e todo homem só quer sexo”. E em segundo, porém não menos importante, porque todo tipo de imperativo, seja ele trabalhista, sexual ou familiar, ignora particularidades. Que talvez sejam o tempero que deixa o mundo um pouquinho mais interessante – coisa que até a sua avó sabia quando um dia disse: o que seria do azul se todo mundo gostasse de vermelho?
E nem todo mundo gosta de vermelho. Assim como nem todo mundo tem como ideal de felicidade um relacionamento em que o sexo seja a força motriz. Conheço casais que transam duas vezes por mês e vivem na maior harmonia – por mais incompreensível que isso possa ser para os seus padrões. E por mais que você seja integrante daqueles casais que transam até na casa da avó, é absolutamente normal, meu amigo, você negar fogo vez ou outra. Principalmente quando o relacionamento amadurece e aquele furor inicial vai embora. E natural você não estar a fim. Dizer: “hoje eu não quero. Preferiria dormir abraçado”. Ou assistir àquele filme até o final, sem que nossos corpos se entrelacem aos vinte e três minutos de vídeo. Ou dedicar o tempo que transaríamos a cozinhar uma torta gostosa e diferente. É normal, natural, aceitável e compreensível. É, acima de tudo, humano.
Mas a ditadura da paudurescência diz que as coisas não são bem assim. Também pudera: em um mundo onde homens são medidos por virilidade e mulheres por gostosura, é ingenuidade demais querer que o cenário seja outro. E aí, tudo o que se cria é uma rede assustadora de insegurança, em que a autoestima, a autoconfiança e, inclusive, a confiança no outro estão pautadas no desejo e na percepção do próximo, e nunca na essência de nós mesmos. Ela sempre quer transar. Se hoje não quis, deve ser porque eu não tenho mandado bem na cama. Ele nunca nega sexo. Se negou, deve ser porque eu engordei. Ou porque a depilação está atrasada. Ou porque minha calcinha é bege. Ou porque tem outra. Ou porque quer terminar.
E por aí vão os devaneios. Por isso, da próxima vez em que aceitar transar só pra cumprir o seu papel social de parceiro sexual, reflita. Sexo só é gostoso quando feito com vontade. E se é verdadeiramente consensual. Nada nesse mundo pode ser mais cruel do que mentir para si mesmo.
Por Bruna Grotti
http://www.casalsemvergonha.com.br/2014/03/28/nao-se-desespere-voce-nao-e-obrigado-a-transar-todos-os-dias/
#oremos
Andreh Carvalho
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